Precisar de gente

No Brasil, quase todo tipo de negócio requer gente. Seja o cobrador do ônibus, o caixa do supermercado, o frentista do posto de gasolina, serviços diversos dependem de gente, até quando seria desnecessário. Falo isso porque noto, em outros países, a prevalência do self service. A própria pessoa faz tudo, paga e finaliza o trabalho.

Mais do que simplesmente resumir este aspecto ao rés do chão dizendo que “gera empregos”, posso dizer que nossa cultura brasileira prioriza o contato com pessoas, quer ser atendida por gente. Daí, mesmo que seja algo que prescinda de pessoas, precisa ter alguém para dar as coordenadas, informar e mesmo realizar o trabalho.

Nós precisamos desta interação social, até para que possamos sentir que somos parte de um sistema maior. Meu exemplo acontece no posto de gasolina onde abasteço: os frentistas me conhecem desde a adolescência, e alguns lembram das minhas dificuldades em manobrar o carro no início, logo ao pegar a habilitação. E nisso se vão anos e anos.

Há um senso de “pertencimento”, por assim dizer. Como se o negócio – o posto de gasolina – ter se tornado parte da minha história e eles influenciando nestas lembranças. E outros clientes, com histórias semelhantes, também criaram estes laços, influenciando a eles, os prestadores de serviço, em sua forma de enxergar a vida.

Há duas semanas ministrei treinamento para uma empresa de Saúde. Ali notei o quanto as pessoas querem a interação com alguém, mesmo que para isso precisem ficar doentes. Pois doentes podem “exigir” a atenção devida, como se fosse “obrigação” do profissional da saúde. Mas a verdade embutida é a necessidade de alguns doentes crônicos de ter a rotina daquele contato que por vezes olha mais nos olhos do que os parentes e amigos. Há situações que é preciso tocar o paciente, e para este que é tocado, talvez seja o único toque que irá receber naquela semana.

É dito que brasileiros gostam de tocar as pessoas, e que outros povos são menos receptivos. Discordo. Brasileiros até demonstram mais isso publicamente, mas outras culturas também gostam do toque, mas o fazem por vezes mais discretamente. Entretanto, o olhar profundo que recebi em tantas ocasiões fora do Brasil e por tanta gente diferente me faz crer que não é preciso tocar ou estar junto para acarinhar alguém.

Mas que é bom, o contato físico, ah, isso é.

Se bom é, podemos assumir que queremos tocar, interagir e precisar de gente para nossa vida ter mais colorido e sermos felizes. Sozinhos não caminhamos com alegria, embora possamos efetivamente nos bastar, quando temos internamente nossa verdade, nossa essência EU SOU. Vivemos sós, no resumo da ópera, querendo sempre interagir e sentir o acolhimento. E quando estamos centrados em nós, na nossa verdade, ficamos muito mais abertos ao outro, para entender e dar a receptividade que o outro deseja.

E a vida fica bem mais colorida, né não?

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