E se eu não quiser andar de carro?


Desde o início do ano venho ouvindo e lendo sobre os problemas no transporte público na cidade de São Paulo. OK, atualmente não resido nela, mas sei da sua importância estratégica na economia do país – e serei sempre uma paulistana pois que meu carinho por esta cidade nunca irá diminuir – daí pergunto o que pode resolver efetivamente este problema que vem se arrastando e, para minha surpresa, só aumenta.

Digo para minha surpresa porque desde a adolescência noto o sistema de transporte público como muito ruim, e ao longo do tempo ele apresentou movimentos que poderiam melhorar, senão na fluidez mas na acessibilidade. Iniciativas inteligentes foram instaladas, como o bilhete capaz de transferir de um transporte para outro com menor custo – como existe no exterior há muito tempo – e uma integração mais fácil dos transportes para a população. Também vi iniciativas péssimas, fundamentadas no conceito de ganhar a qualquer custo, como o monstrengo fura fila que com nada se integra e teve custo absurdo, ou ainda a linha de metrô lilás, que ficou por anos desligada da malha de transportes. Tudo isso aconteceu dos anos 80 em diante sem no entanto planejar o aumento do fluxo de passageiros. O resultado nós temos visto todos os dias. Surpresa: o transporte público só piorou.

Daí o argumento que eu mais ouço quando comento isso é “que bom que você tem carro né?”. Realmente gosto de ter carro e principalmente, gosto de dirigir. Entretanto, o que acontece com quem não quer dirigir ou mesmo não pode? Ficam em casa trancadas sem acesso à mobilidade que caracteriza uma urbanização inteligente? Eu poderia ter a oportunidade de não dirigir para me deslocar, principalmente quando quero evitar estacionamentos abusivos, lugares onde é mais fácil caminhar para encontrar o que eu preciso? Ou ainda, poderia ter a grata satisfação de usar o imposto que pago para me deslocar usando o transporte público com a segurança que chegarei no destino – e assim relaxar lendo ou ouvindo música tranquilamente?

Ter carro não significa, e nem deveria significar a resolução dos problemas de transporte.

Ouço também os defensores das bicicletas – que realmente não poluem e isso faz muita diferença. Mas começo dizendo que sou péssima com duas rodas; e outra coisa: como eu iria cumprir meus compromissos profissionais levando equipamentos nos dias de chuva? A bicicleta é um recurso mas não a vejo como opção em São Paulo para transporte público. Em Santos, onde há uma ciclovia que parte do terminal portuário em direção a São Vicente, passando ao largo da via dos carros e ônibus, é totalmente diferente. Também ajuda a topografia, plana em sua maioria.

Não acho que a solução sejam as bicicletas, até porque idosos e deficientes, mães com crianças ficariam de fora desta condição – e daí voltamos para as iniciativas do poder público que precisam e devem cumprir com o prometido: transportar dignamente a população.

Aqui vale ressaltar um ponto importante: sabemos que o poder público não tem cumprido sua missão tanto no transporte quanto em outras competências. No entanto, nada justifica vandalismos, destruições ou conflitos que acabam por piorar as estruturas existentes. Vi recentemente uma estação de trem sendo depredada por falhas no transporte; isso só atinge diretamente a quem o usa todos os dias. Os diretores continuarão a usar outra forma de deslocamento, e quem é prejudicado – a população - tem sem cenário ainda mais degradado.

Para mudar este estado de coisas o que definitivamente não funciona é a violência e conflito.

O que funciona é o questionamento de todos, tanto na imprensa quanto nas conversas cotidianas, usando ou não o transporte público. É colocar na pauta de questionamentos aos políticos sobre o uso da verba de transporte e extensão da malha circulante levando em conta projeções de crescimento populacional, demanda urbana, espaço circulante dimensionado para tráfego entre outros fatores que os especialistas em mobilidade urbana sabem muito bem calcular. É preciso cobrar, principalmente em ano de escolha de novos dirigentes – cobrar sempre, mais do que criticar. Manter a atenção para o tema mesmo que o carro ainda seja uma saída. Não é porque não nos atinge que seremos omissos, pois que chegamos a este estado de coisas por comodismo. Se queremos uma sociedade mais justa, ela começa com a mobilidade de todos para todo lugar por ser uma obrigação do estado.

Quero dirigir quando eu quiser para passear e curtir minha linda e amada São Paulo.

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