E aí, vai de bife?
Depois de falar de quaresma, fica parecendo lição de moral ou algo com teor religioso, mas não é. Eu hoje lia sobre a influência de alimentos nas pessoas – e inclusive vai ter um programa na TV falando sobre isso nesta noite – pra pensar que a questão vegetariana vai além de simplesmente poupar carnes.
Uma experiência pessoal: durante anos fui fissurada em comer carne, do jeito que fosse apresentada e de qualquer maneira. Nisso entenda que poderia ser malpassada, ao ponto e bem passada. Chegava a salivar só de pensar na possibilidade de fechar a noite traçando um baita prato com carne. Churrasco então, era o delírio! O detalhe é que eu me sentia extremamente bem depois de comer carne, a ponto de ser uma super-heroína mesmo, capaz de qualquer coisa. Poderia ficar sem dormir noites inteiras (coisa que eu fiz enquanto trabalhava na redação da FT) e mesmo dançar horas a fio sem me cansar.
No entanto, o corpo apontava o excesso de carne e derivados de forma curiosa: espinhas espalhadas pelo corpo, suor forte, oleosidade nos cabelos e pele, unhas fracas e quebradiças. O humor era de extremos – ora muito alegre, ora muito triste – e eu ficava triste com grande facilidade. Guardava muito mais mágoa do que hoje, e ficava remoendo o passado procurando culpados, algozes e imaginando como seria o processo vingativo que mereceriam. E eu sentia tudo isso como normal, pois era o hábito da minha vida naquele momento.
Fato é que ter um animal de estimação foi o primeiro passo para mudar muita coisa. Eu peguei uma cachorra, a Kyra, e depois de ter um bichinho em casa, do qual eu cuidava e pensava que ela era tão quadrúpede quanto os bois e derivados criados para consumo é que houve um questionamento.
Será que eu teria coragem de matar a Kyra pra comer?
Uma experiência pessoal: durante anos fui fissurada em comer carne, do jeito que fosse apresentada e de qualquer maneira. Nisso entenda que poderia ser malpassada, ao ponto e bem passada. Chegava a salivar só de pensar na possibilidade de fechar a noite traçando um baita prato com carne. Churrasco então, era o delírio! O detalhe é que eu me sentia extremamente bem depois de comer carne, a ponto de ser uma super-heroína mesmo, capaz de qualquer coisa. Poderia ficar sem dormir noites inteiras (coisa que eu fiz enquanto trabalhava na redação da FT) e mesmo dançar horas a fio sem me cansar.
No entanto, o corpo apontava o excesso de carne e derivados de forma curiosa: espinhas espalhadas pelo corpo, suor forte, oleosidade nos cabelos e pele, unhas fracas e quebradiças. O humor era de extremos – ora muito alegre, ora muito triste – e eu ficava triste com grande facilidade. Guardava muito mais mágoa do que hoje, e ficava remoendo o passado procurando culpados, algozes e imaginando como seria o processo vingativo que mereceriam. E eu sentia tudo isso como normal, pois era o hábito da minha vida naquele momento.
Fato é que ter um animal de estimação foi o primeiro passo para mudar muita coisa. Eu peguei uma cachorra, a Kyra, e depois de ter um bichinho em casa, do qual eu cuidava e pensava que ela era tão quadrúpede quanto os bois e derivados criados para consumo é que houve um questionamento.
Será que eu teria coragem de matar a Kyra pra comer?
A resposta era óbvia que não, jamais eu faria isso. Mas indiretamente matava diversos animais diariamente, até cinco vezes ao dia – algo que era como um deleite gastronômico, imagine! – sem no entanto ver uma gota de sangue, já que os bichos vinham embalados hermeticamente. Manusear um frango cortado, sem cabeça ou pés, diminui a culpa de qualquer pessoa. O mesmo vale para as bistecas de porco, que parecem ser comida de gente mesmo, afinal não tem a cara do porquinho pra me culpar.
Ainda em casa minha família tinha duas calopsitas, aves como o são as galinhas. OK, calopsitas cantam, voam, são coloridinhas e interagem com as pessoas. E as galinhas, são diferentes? Já ouvi histórias de quem criava galinhas que atendiam quando se chamava o nome, com temperamento e tudo o mais. Eu não admitiria comer as calopsitas, menos ainda pensar na hipótese de matar uma galinha pra comer. E coelhos? Delicados, olhos vermelhinhos... um dia vi um coelho sem pele no setor de carnes do supermercado aqui perto e quase tive um treco. Pedi ao açougueiro pra pelo menos não “ exibir” aquilo, já que quem come isso sabe bem como é e não precisaria desta imagem, e para quem não gosta seria melhor ser poupado deste horror.
Mas um fato era inegável, eu sentia falta de comer carne. Neste meio tempo surgiu o famoso livro da dieta do tipo sanguíneo, e o meu tipo era descrito como o “total carnívoro”. Isso talvez explicasse o fato de eu nunca ter passado mal mesmo quando comia cinco quilos de carne malpassada – e todos os outros convivas morriam de dor de barriga – e o máximo que eu poderia sentir era o aumento de peso. Pra uma pessoa originalmente macérrima, ganhar um quilinho não fazia mal algum.
O que me fez parar de comer carne alucinadamente foi a culpa, devo admitir. Ainda hoje escorrego se me for apresentado um prato maravilhoso e suculento, portanto evito este tipo de confronto. Certos animais nem passam mais pelo meu pensamento em se tornar comida, como é o caso do porco, do coelho, do carneiro; mas eu ainda tropeço se aparecer uma costela de ripa, confesso.
O visual da carne é apelativo, mas eu fico hipnotizada pelo poder que o cheiro de carne preparada tem. Cheiro de churrasco, aquela coisa embriagante, me tira do sério. O detalhe é que freqüento um lugar que é churrascaria e tenho conseguido manter a sanidade mesmo em meio a um festival de espetos de cadáveres aromatizados com toda a boa intenção de satisfazer os clientes.
O ponto final da carne – que pude entender claramente depois de ter deixado o consumo de carne ao quase nada – é que ela realmente afeta o equilíbrio. Quando comia carne eu era a “risca faca”, procurava briga, crítica e oportunidade para uma boa celeuma. Minha experiência pessoal aponta a carne como excelente combustível pra bater boca por horas, e despejar imensos fluidos de conflito e belicosidade. A redução da carne coincidiu com uma calma maior nos meus processos emocionais, bem como num uso inteligente das relações com as pessoas. Percebi que fazia mais com menos, e não queria mais controlar tanto as pessoas ao meu redor.
Sinto que a ausência da carne na minha vida deixou um espaço para outros sabores – o da mudança na textura da pele, agora mais viva; o cabelo mais brilhante e uma sensação de leveza, algo difícil de mensurar mas maravilhoso em sentir – e uma paz por não contribuir para um sistema que traduz sofrimento animal em desempenho financeiro. OK, sei que há abatedouros um pouco preocupados com o bem estar dos animais... mas não são a maioria, e sinceramente acho que não estou perdendo nada deixando os bichos livres para viverem seu ciclo sem se tornarem vítimas do humano. Definitivamente, meu bife não vale uma vida.
Comentários